Ainda que tenha se destacado como mais progressista que seu antecessor, o papa Francisco, líder da Igreja Católica que faleceu na madrugada desta segunda-feira (21/4) aos 88 anos, também deu algumas declarações polêmicas durante os 12 anos de seu pontificado.
Ele defendeu o direito de homossexuais a terem uma família, mas afirmou “ser homossexual não é crime, mas é pecado”. Também seguiu firme na defesa da Igreja contra o aborto e disse que a interrupção da gravidez, a mudança de sexo, a eutanásia e a barriga de aluguel constituem “ameaças graves à dignidade humana”.
Torcedor apaixonado por futebol, o papa chegou a eleger um brasileiro após ser questionado qual dos argentinos preferia: Lionel Messi ou Maradona.
Conhecido pela postura humilde e avesso à pompa do Vaticano, Francisco disse que o homem está se tornando “prisioneiro de mitos do dinheiro, do poder e do sucesso”.
Com a saúde frágil há meses, o pontífice ficou internado por cerca de 40 dias após uma pneumonia dupla. A causa da morte ainda não foi divulgada.
A última aparição pública de Francisco ocorreu no Domingo de Páscoa (20/4), na Praça de São Pedro, para abençoar os fiéis. Ele acenou para as milhares de pessoas que estavam presentes e durante a mensagem de Páscoa fez um apelo aos responsáveis políticos “para que não cedam à lógica do medo, mas usem os recursos disponíveis para ajudar os necessitados, combater a fome e promover iniciativas que favoreçam o desenvolvimento.”
Relembre algumas frases do papa Francisco:
Gays e casamento homossexual
Em 2013, ano em que assumiu o papado, em seu livro “Sobre o Céu e a Terra”, o Papa afirmou que equiparar casamentos homossexuais e heterossexuais era “uma regressão antropológica” e que a permissão de adoção a casais do mesmo gênero poderia afetar as crianças, pois “cada pessoa precisa de um pai homem e de uma mãe mulher que possam ajudá-los a moldar sua identidade”.
Ainda em 2013, Francisco disse que atos homossexuais são pecados, porém, a homossexualidade em si, não.
“Se uma pessoa é gay, busca a Deus e tem boa vontade, quem sou eu para julgar?”.
Em 2018, o Papa disse que tinha preocupações com a homossexualidade dentro do clero e que este era “um assunto sério”.
Em 2020, em uma mudança mais efetiva no discurso, o chefe supremo da Igreja católica defendeu que pessoas LGBTQI+ deveriam ter os mesmos direitos que os casais heterossexuais:
“Homossexuais têm o direito de estar em uma família. Eles são filhos de Deus e têm direito a uma família”.
Em 2022, o pontífice fez um apelo para que os pais de filhos de casais formados por LGBTQI+ não os condenem pela orientação sexual.
Já em 2023, em entrevista à agência de notícias Associated Press (AP), o papa afirmou que “ser homossexual não é crime, mas é pecado. Tudo bem, mas primeiro vamos distinguir entre um pecado e um crime”. Após a repercussão da fala, ele publicou uma carta em que dizia ter sido mal interpretado por ter utilizado uma linguagem coloquial para a televisão.
Ainda em 2023, durante a Jornada Mundial da Juventude (JMJ), o Papa disse que pessoas LGBTQI+ devem ser aceitas no catolicismo, pois busca tornar a igreja um lugar mais acessível e menos condenatório.
Em 2024, Francisco disse que a Igreja Católica deveria abençoar casais LGBTQI+ que desejavam casar sob a bênção divina, por um documento do Vaticano chamado Fiducia Supplicans. A declaração de Francisco gerou muita polêmica entre os praticantes da religião.
Ainda sobre os homossexuais, em reunião a portas fechadas com bispos italianos no ano passado, Francisco disse que os seminários estão “cheios de viadagem”, segundo relatos da imprensa italiana.
Aborto
Em 2024, o Vaticano publicou um documento assinado pelo papa Francisco afirmando que mudança de sexo, eutanásia, aborto e barriga de aluguel constituem “ameaças graves à dignidade humana”. O texto também inclui guerra, abuso sexual, pobreza e pena de morte entre os fatores que simbolizam graves violações aos direitos básicos dos indivíduos.
O documento afirma que a barriga de aluguel viola a dignidade da genitora e da criança. Quanto à mudança de gênero, o texto afirma que “qualquer intervenção de mudança de sexo, como regra, corre o risco de ameaçar a dignidade única que a pessoa recebeu desde o momento da concepção”.
Em missa no primeiro dia de 2025, o papa reforçou com os fiéis que eles devem se opor ao aborto e ter um “compromisso firme” com a proteção e o respeito a vida desde a concepção até a morte natural.
O Vaticano também reforçou sua condenação permanente ao aborto, pena de morte e eutanásia.
Direitos das mulheres
Apesar de o sacerdócio feminino continuar proibido, o papa ficou conhecido por nomear mulheres para cargos de destaque no Vaticano. Ele defendeu a igualdade de gênero e a importância da participação das mulheres na vida da Igreja.
O pontífice também condenou a cultura machista e a violência contra a mulher.
“Nós estamos acostumados a essa cultura machista, a ver a mulher, não digo como o cachorrinho ou o gato de casa, mas como um ser humano de segunda categoria”, afirmou ele em dezembro de 2024. E completou: “ E não vamos nos esquecer que são as mulheres a levar o mundo adiante e — como alguns dizem — são elas que comandam. Mas tudo bem. Mas é a mulher que leva adiante a família, que leva adiante os povos, que se aproxima das necessidades, aquela sensibilidade tão rica da mulher.”
Futebol
Torcedor ilustre do San Lorenzo, clube localizado na cidade de Buenos Aires e sediado no bairro de Boedo, paixão do papa pelo clube vem desde a infância. Jorge Mario Bergoglio cresceu no bairro de Flores, vizinho a Boedo, herdando o sangue azulgrana da família, que toda semana comparecia ao Viejo Gasómetro, antigo estádio do San Lorenzo.
O clube argentino é tradicional no país, mas ficou mundialmente conhecido por conta do papa.
Em entrevista para a TV italiana TG1, o papa foi questionado qual dos dois jogadores argentinos achava melhor, Messi ou Maradona, ao que respondeu:
“Acrescento um terceiro: Pelé. São os três que eu vi (jogar). Maradona, como jogador, é ótimo, mas como homem falhou. O coitado escapou da corte daqueles que o bajularam e não o ajudaram. Ele veio me ver no meu primeiro ano de pontificado e depois o pobre rapaz morreu no final”, iniciou.
Dinheiro
Em 2015, o papa disse que é “triste” quando bispos e padres estão “apegados ao dinheiro” para avançarem na carreira.
“Até na Igreja há esse tipo de pessoa, que, em vez de estar servir pensando nos outros, usa a instituição. Eles são carreiristas, apegados ao dinheiro”, criticou.
Em um habitual Angelus dominical de 2024, o papa disse que o homem deve sempre se perguntar se ainda é uma pessoa livre ou se, em vez disso, está se tornando “prisioneiro de mitos do dinheiro, do poder e do sucesso”. O santo padre convidou os fiéis e peregrinos reunidos na Praça São Pedro a refletirem sobre a liberdade de Jesus, que era “completa e sem condicionamentos”.
No início deste ano, o papa promoveu evento reunindo líderes religiosos, economistas e representantes governamentais para discutir formas de reduzir a desigualdade econômica.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) enviou um vídeo ao Papa Francisco apoiando a taxação dos super-ricos. Em junho de 2024, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, reuniu-se com o pontífice para tratar do tema. Na ocasião, Francisco defendeu a necessidade de “uma nova arquitetura financeira internacional, audaz e criativa”
Na última Sexta-feira Santa, Francisco criticou a economia atual ao falar de Jesus Cristo: “Cristo, pregado, se coloca no meio das partes, entre os opostos e os leva ao Pai, pois sua cruz derruba os muros, cancela as dívidas e estabelece a reconciliação. Diante das economias desumanas, feitas de cálculos, lógicas frias e interesses implacáveis, a mudança de rumo é voltar-se para o Salvador”, afirmou Francisco.