Em meio a queda de adoções em SP, mães incentivam iniciativa: “Mágico”

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São Paulo – Entre 2023 e 2024, o estado de São Paulo registrou uma diminuição de 10% em casos de adoção, segundo cálculo feito pelo Metrópoles por meio de dados coletados pelo Tribunal de Justiça paulista (TJSP). Apesar do cenário de queda, famílias paulistanas incentivam o ato de descoberta e amor.

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Maria Cecilia e Felipe Rogério Gonsalves com as filhas

O casal adotou irmãs em 2024
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Pamela Justino com a filha. Ela concluiu o processo de adoção em dezembro de 2024

Material cedido ao Metrópoles

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Maria Cecilia e Felipe Rogério Gonsalves com as filhas

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O casal adotou irmãs em 2024

Material cedido ao Metrópoles

Pamela Justino, de 28 anos, tornou-se mãe de Karine, de 1 ano, por meio da adoção. Natural de Itaquera, na zona leste, a vigilante e técnica de enfermagem concluiu o processo em 5 de dezembro do ano passado.

“Eu era casada quando iniciei processo de adoção, em 2018, mas, no percurso, meu relacionamento acabou e dei continuidade ao processo sozinha. Diversas pessoas diziam que eu não iria conseguir, pelo motivo de ser solteira, mas sempre fui uma pessoa persistente em tudo”, reconhece. “Em 13 de fevereiro de 2019 fui habilitada; Foram cinco anos na fila de adoção. Finalmente, em 7 de março de 2024, meu telefone tocou e era o fórum, avisando que, no dia seguinte, iria fazer chamada de vídeo para me contar sobre a história criança”, relembra.

Por chamada de vídeo, Pamela viu — emocionada — uma foto da bebê que se tornaria filha. Depois de 15 dias, conseguiu autorização para a primeira visita pessoalmente.

“Nosso primeiro contato foi algo inesquecível. Ela me olhou [com] aqueles olhinhos de ‘quem será essa moça?’, eu dei os braços… Ela veio no meu colo. Foram 15 dias de adaptação, ela não estranhou nenhum dia, não teve choros, mas, sim, muito sorrisos, brincadeiras”, detalha. “A espera não é nada quando o amor é tudo”, comemora.

Em abril, Pamela obteve a guarda provisória. “Viemos para casa, ela dormiu tranquilamente; não houve nenhum tipo de estranhamento. Foi e tem sido algo maravilhoso, mágico, com muito amor e carinho. É uma ligação, algo tão forte que não sei explicar e jamais pensei que seria tão intenso assim. Para mim, adotar é acreditar que a história é mais forte que a hereditariedade, que o amor é mais forte que o destino.”

Outro trâmite de adoção finalizado em 2024 foi o da professora Maria Cecilia Gonsalves, de 37 anos. “Adotar é poder amar sem saber quem será seu filho(a) e poder cuidar dessa criança com a alma”, define a paranaense radicada em Indaiatuba, no interior de SP.

Casada com o técnico em logística Felipe Rogério Gonsalves, de 33 anos, ela nunca quis engravidar e sempre cultivou com o marido a ideia de se tornarem pais pela adoção. No entanto, o processo foi longo: começou em 19 de julho de 2019 e terminou em 17 de novembro de 2024. O casal adotou Carolina, de 4 anos, e Jade, de 3.

“Nosso processo foi muito cansativo, e só conseguimos a adoção porque eu fui atrás da busca ativa. E teve momentos que pensei em desistir, por conta da demora”, conta. “Mesmo [que] o processo seja demorado, quando seu filho(a) chega, é a melhor coisa do mundo”, celebra Maria Cecilia.

A Busca Ativa Nacional é uma medida do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para facilitar a adoção de crianças e adolescentes que não têm o perfil mais desejado pelos cadastrados no Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA).

No Brasil, de acordo com o órgão, atualmente há 4.930 crianças e adolescentes disponíveis para adoção e 1.356 na categoria ativa. Com processo em andamento, são 5.995.

A assistente social Gisele Oliveira destaca que quem decide quais crianças vão para colocação em família por adoção é o Judiciário. “Hoje, o que seria prioridade é a conscientização e a mudança de perfil que as famílias querem adotar, senão invertemos as prioridades”, avalia a especialista. “A prioridade é a criança que precisa de uma família, e não a família que deseja um perfil específico de criança”.

Entenda os dados de São Paulo

  • Ao longo de 2024, no estado de São Paulo, houve 1955 adoções. Desses, 206 são adolescentes com mais de 12 anos; 311 são crianças de 8 a 12 anos; e a grande maioria, 1438, têm até 8 anos.
  • Na capital paulista, no ano passado, o total de casos foi de 388. Foram 27 adolescentes com mais de 12 anos; 68 crianças de 8 a 12 anos; 293 de até 8 anos.
  • Em 2023, o estado registrou 2.165 adoções, das quais 271 são adolescentes com mais de 12 anos; 361 crianças de 8 a 12 anos; e 1.533 bebês e crianças de até 8 anos.
  • Na capital, ao longo de 2023, foram 418 casos: 44 adolescentes com mais de 12 anos; 68 meninos e meninos de 8 a 12 anos; e 306 crianças de até 8 anos.
  • Atualmente, no estado, há 1.366 crianças e adolescentes disponíveis ou vinculados para adoção, dos quais 282 integram a busca ativa.

Adoção no Brasil

  • Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por meio do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento, a maioria dos casos de adoção no Brasil ocorre na região Sudeste.
  • De 2019 a janeiro de 2025, foram concretizados 10.605 casos, somando os estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo.
  • Na segunda posição, aparece o Sul, com 8.522 adoções no mesmo período.
  • Já nas regiões Nordeste, Centro-Oeste e Norte registraram 3.270, 1.967 e 896 processos finalizados, respectivamente.
Dados do CNJ sobre adoção - Metrópoles
Dados do CNJ

Famílias acolhedoras

Dentro do espectro da adoção, há a nomenclatura de “família acolhedora”. São pessoas que não têm intenção de adotar, mas acolhem crianças e adolescentes temporariamente. Trata-se de um serviço no âmbito social, com o objetivo de proporcionar tratamento personalizado, convivência familiar e comunitária.

Para participar, o interessado deve preencher alguns requisitos. São eles: estar saudável; ser maior de 21 anos; não estar no Cadastro Nacional de Adoção; ter disponibilidade afetiva e emocional; não ter antecedentes criminais; concordância dos membros da família; e ser aprovado nas etapas de documentos e capacitação.

Atualmente, de acordo com o CNJ, no Brasil, há 33.267 crianças e adolescentes acolhidos. Do total, apenas 6.1 % estão sob os cuidados de famílias acolhedoras. A grande maioria fica em abrigos institucionais.

A assistente social Gisele Oliveira, que gerencia o Pérolas, um serviço de família acolhedora em Santo Amaro, na zona sul, explica que a iniciativa seleciona famílias para receberem crianças, sob o intuito de evitar que elas sejam levadas a abrigos convencionais.

“Segundo pesquisas já comprovadas, a permanência da criança em acolhimento institucional traz prejuízos e, dependendo do tempo, consequências para a vida toda”, explica.

“Hoje, infelizmente, no Brasil, há um número muito pequeno de acolhimento em famílias, justamente porque ainda existe pouca divulgação e os próprios municípios ainda não têm um grande engajamento nesse trabalho”, acrescenta a especialista.