São Paulo — Alçado ao posto de comandante da Polícia Militar (PM), o coronel José Augusto Coutinho tem pela frente o desafio de conter o aumento da letalidade policial e os episódios de violência que fizeram o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) admitir, em dezembro do ano passado, uma crise institucional.
O novo comandante terá ainda de enfrentar o desgaste causado pelo envolvimento de policiais militares da ativa com integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC), descoberto durante as investigações sobre o assassinato do corretor de imóveis Vinícius Gritzbach, em 8 de novembro. Antes de ser executado, ele havia delatado corrupção de policiais civis e um esquema de lavagem de dinheiro da facção.
A cerca de um ano e meio das eleições de 2026, coronel Coutinho, que é tido como “queridinho” do secretário da Segurança Pública, Guilherme Derrite, enfrentará o aumento da pressão política sobre a PM paulista. Tarcísio e o próprio secretário devem concorrer e têm a segurança pública como principal bandeira.
Foi justamente o cálculo político que fez o governador adiar a troca no comando da PM. No ano passado, Tarcísio teria aventado a possibilidade de “entregar a cabeça” do então chefe da corporação, coronel Cassio Araújo de Freitas, para aliviar a pressão e manter Derrite no cargo.
A avaliação, no entanto, foi que a substituição naquele momento poderia representar um sinal de fraqueza para os adversários.
Agora, segundo autoridades da Segurança Pública e integrantes da cúpula da PM, a substituição foi “natural”, levando em consideração o limite de cinco anos para que um oficial permaneça com a patente de coronel. Cassio recebeu a patente em fevereiro de 2020. Mas, por ocupar o posto de comandante-geral, estava imune ao prazo.
Violência e letalidade
- Em 2024, segundo ano da gestão Tarcísio, a letalidade da PM cresceu 90%, atingindo a marca de 595 vítimas no período. Pelo menos 69 ocorreram entre 27 de janeiro e 31 de março na Baixada Santista, durante a Operação Verão, marcada por denúncias de tortura e execuções sumárias.
- Neste ano, em meio a pressão política, a PM colocou o “pé no freio” na região, deixando de lado o envio em massa de tropas de batalhões especializados da capital e do interior para realizarem incursões em comunidades do litoral sul paulista.
- A mudança de postura refletiu em uma diminuição na letalidade policial nos três primeiros meses do ano, de acordo com dados do Grupo de Atuação Especial de Segurança Pública (Gaesp), do Ministério Público de São Paulo. Entre janeiro e março do ano passado, foram 212 mortes decorrentes de intervenção policial, entre PMs em serviço e de folga. No mesmo período deste ano, foram 158.
- Apesar da redução no índice, vídeos de abordagens violentas por parte de PMs continuam a gerar questionamentos sobre a atuação da corporação. Em 12 de abril, um ambulante senegalês foi morto a tiros por policiais do Choque durante uma confusão por conta da fiscalização de mercadorias no Brás, centro da capital. Ele não portava arma de fogo e segurava uma barra de ferro.
- Em Piracicaba, no interior do estado, Gabriel Junior Oliveira Alves Da Silva, de 22 anos, foi morto na frente da esposa grávida. Ele também estava desarmado. Segundo os policiais, o tiro na cabeça foi necessário porque o rapaz teria partido para cima da equipe da PM com uma pedra.
Assista:
Policiais da Rota com o PCC
- As investigações sobre o assassinato de Vinícius Gritzbach, em novembro de 2024, revelaram o envolvimento de policiais militares com integrantes do PCC. A conclusão do inquérito foi que os cabos Denis Martins e Ruan Silva e o tenente Fernando Genauro foram os executores do crime. Há a suspeita que outros PMs, que faziam escolta para o delator, também tenham participado, facilitando a ação dos atiradores.
- Para além disso, durante as investigações, veio à tona um esquema envolvendo PMs da Rota, elite da corporação, para beneficiar integrantes da cúpula do PCC na zona leste. Conforme revelado pelo Metrópoles, o novo comandante da PM, José Augusto Coutinho, que na época chefiava a Rota, foi informado sobre o esquema, mas não teria tomado providências.
- O esquema foi descoberto a partir de uma espécie de delação premiada informal de um traficante do PCC, que ocorreu no batalhão da Rota, em 2021. Na ocasião, ele detalhou como policiais do serviço de inteligência cobravam milhões de reais para manter chefões do PCC informados sobre operações do MPSP.
- Na ocasião, o traficante forneceu um áudio do então número 1 da facção nas ruas, Marcos Roberto de Almeida, o Tuta, relatando como escapou da Operação Sharks, em 2020. Tuta diz que pagou R$ 5 milhões a policiais, de forma parcelada.